Famintos por tempo | André Caldeira para Exame.com

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Time Famine é uma expressão recente que diz muito sobre a rotina que vivemos hoje em dia. Trata-se da fome, quase desesperada, que temos, nos dias de hoje, por mais tempo.

Queremos mais tempo para trabalhar e produzir. Mais tempo para socializar nas redes sociais. Para nossa vida pessoal. Tempo até para conseguir apreciar, de fato, o que conquistamos ou o que compramos com o dinheiro que ganhamos.

Mas até para isso, paradoxalmente, também não temos tempo.

Afinal, a conquista de hoje é quase que imediatamente sufocada por tudo o que temos que tentar entregar amanhã. Ou daqui a pouco.

Os dias viram horas. As semanas viram dias. Piscamos e meio ano já passou.

Estamos sempre ocupados, trabalhando muito, respondendo a infinitos e-mails, fissurados por uma rotina de correria e afazeres táticos. Sempre correndo para lá e para cá, ansiando pelo dia de amanhã, quando poderemos, quem sabe, ter mais tempo e aproveitar a vida. Gertrude Stein tem uma frase maravilhosa sobre essa ilusão – There is no there there

Mas eis que o paradoxo aumenta: quanto mais tempo queremos, pior administramos o que temos, de fato.

Quanto de nosso tempo no trabalho é usado para assuntos importante, ligados à estratégia e inovação? Estou falando de temas que podem gerar uma diferença significativa em termos de performance, competitividade e resultados para as empresas. Inúmeras pesquisas apontam para a frustração de CEOs e diretores de empresas sobre a falta de tempo adequado dedicado a temas cujo impacto seria muito maior em seus negócios a longo prazo.

Ao invés disso, estamos ocupados com as reuniões intermináveis, as centenas de e-mails que respondemos (ou não), diariamente. Com o celular que não para de tocar, ou com os relatórios cujos deadlines já passaram.

O tático se sobrepõe ao estratégico. O relevante vira segundo plano. E como não temos todo o tempo que queremos, trabalhamos até mais tarde e nos finais de semana.

De novo, o paradoxo. O tempo que não temos para todo o trabalho tático que devemos entregar invade nossa vida pessoal. E acabamos tendo ainda menos tempo para nossos maridos, mulheres, namorados, filhos e pais. Justamente as pessoas mais importantes em nossas vidas. E mesmo quando conseguimos tempo com eles, estamos sempre com o celular na mão, checando assuntos do trabalho, ligados a assuntos táticos que não nos deixam resetar a cabeça, aproveitar momentos de qualidade real com a família e descansar de fato, para que, no dia seguinte, possamos ser mais produtivos e criativos no trabalho.

O tempo individual é também muito escasso. Não temos tempo para cuidar de nós mesmos, para fazer exercícios, para planejar uma alimentação adequada. Não dormimos o suficiente. Perdemos a capacidade de reservar tempo para o silêncio interior, fundamental para buscarmos as respostas mais importantes em nossas vidas, ligadas à direção, proposito, razão de existência e legado, como alguns exemplos.

Estamos, portanto, famintos por tempo.

Mas se tivéssemos mais tempo, saberíamos distribuir, de fato, esse tempo extra da melhor forma?

Ou somente trabalharíamos mais e mais? Teríamos mais equilíbrio ou reforçaríamos o modo piloto automático atual?

Duas questões são fundamentais neste ponto.

A primeira é que não temos e não teremos este tempo físico adicional. A forma como decidimos e alocamos o tempo para nossas rotinas é uma decisão individual. Mas é preciso trazer consciência para nossas escolhas.

A segunda questão, ainda mais crítica, é que o tempo está passando, nós estamos passando. Daqui a alguns minutos, dias, semanas, meses ou anos, não estaremos mais aqui.

Pense nisso.

Seja no trabalho, na vida pessoal ou nas suas escolhas mais importantes, o que você está fazendo de relevante para melhor aproveitar o tempo que ainda tem?


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