A dificuldade de se observar o longo prazo

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Não é novidade para ninguém que investimentos devem ser analisados e realizados tendo em vista uma perspectiva de longo prazo, especialmente os de maior risco, nos quais normalmente também se encontram os melhores retornos.

No caso brasileiro, a nossa cultura e o histórico de juros altos, liquidez diária e rendimentos atrelados a taxas pós-fixadas em nada contribuem para criar um ambiente de visão de longo prazo nos investimentos. Esse ambiente fomenta a impaciência dos investidores, prejudicial para se atravessar momentos de volatilidade, inerentes a qualquer investimento de risco.

Observamos diversos estudos que demonstram que, embora um determinado fundo de investimento tenha obtido retorno satisfatório ao longo de um período, a média de retorno dos investidores nesse fundo ao longo desse período foi expressivamente menor. Isso ocorre porque os investidores aplicaram no fundo em momentos nos quais o gestor vinha apresentando bom desempenho e saíram durante momentos mais difíceis. Chegamos a uma situação na qual o fundo poderia ter sido muito bem avaliado ao longo do tempo, porém uma pesquisa com as pessoas que investiram nele demonstrou um grande grau de insatisfação.

Podemos observar situações semelhantes ao caso do fundo acima com investimentos em ações: investidores que obtiveram retornos médios ruins dentro de um período longo no qual o mercado de ações como um todo, ou a ação de uma empresa específica, tenha tido desempenho positivo.

Qual terá sido a motivação para a saída dos investidores? O que poderia ter sido feito para evitar essas movimentações?

Na maioria dos casos, o retorno recente do ativo costuma explicar em grande parte essas movimentações. No caso de fundos de investimento, observamos forte correlação das movimentações com o desempenho dos três ou seis meses anteriores, quando a recomendação é para que análises sejam feitas com base em períodos mínimos de 12 meses.

A obsessão por resultados trimestrais das companhias de capital aberto também exemplifica bem essa questão. Essa obsessão acaba muitas vezes criando um ambiente de maior foco em resultados de curto prazo do que em iniciativas e estratégias de médio e longo prazos, com impactos negativos tanto para os administradores dessas empresas como para os investidores. Buscando um distanciamento dessa questão, em 2002 a Coca-Cola anunciou que deixaria de passar ao mercado previsões trimestrais de resultados. A Unilever fez mesmo em 2009, seguida por diversas empresas ao longo do tempo, como Motorola e Gillette. Especula-se inclusive que o investidor Warren Buffett, referência mundial em investimentos de longo prazo, poderia estar por trás desse movimento. Buffett costuma dizer que investe sob o pressuposto de que poderiam fechar o mercado no dia seguinte e só reabri-lo dentro de cinco anos.

De forma simples e objetiva podemos considerar um bom gestor aquele com maior quantidade de acertos do que erros ao longo do tempo. Dito isso, podemos esperar, mesmo de bons gestores, erros e fases difíceis. Tudo mais constante, esse seria exatamente o melhor momento para investir nesse gestor.

As empresas também possuem ciclos, pois são afetadas por questões internas, como sucessão, reestruturações e entrada em novos mercados, ou externas, como novas tecnologias, concorrência, regulamentação e questões macroeconômicas. Empresas sólidas muito provavelmente se ajustarão ao longo do tempo e voltarão a trazer bons resultados. Investir nesse momento, embora mais incerto, pode ser muito mais rentável do que investir quando a empresa apresenta desempenho excepcional.

Análises iniciais bem fundamentadas e disciplina de reavaliações periódicas, com forte auxílio de questões qualitativas, certamente contribuiriam muito para que investidores fossem menos suscetíveis a números de curto prazo e pudessem observar mais o longo prazo. (Claudio Mifano – Valor Online)

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